Seus olhos sempre foram os mesmos, desde a infância. Olhos grandes. A íris, marrom como brigadeiro, tem um contorno preto, como se alguém a tivesse desenhado ali com um lápis. A pupila, dilatada pela pouca luz do quarto, tenta captar o rosto da menina que já é mulher. A vontade de observar é tamanha que as pálpebras quase não se mexem e, quando o fazem, é por um breve segundo, para não perder muita coisa. Com seu movimento, os longos cílios também se movimentam, dançando – sem música. Logo abaixo dos olhos, duas pequenas bolsas escuras, que guardam o cansaço do dia, são disfarçadas ocasionalmente com a maquiagem. E a tudo isso ornam as sobrancelhas de fios escuros, ora franzidas de dúvida, ora arqueadas de alegria.
O nariz… bem, ela nunca gostou dele. Isso porque ele não tem a comum dobrinha que mostra onde a testa termina e onde ele começa, transformando-os em uma só coisa. Pequenos pontinhos pretos na ponta, como se fossem minúsculas formigas dormindo, esperando que alguém as tire dali.
Grandes bochechas, que a tia aperta, a mãe beija e um elogio tinge de escarlate.
Boca minúscula na cara emburrada, pequena no rosto sério, grande na risada incontida. Os dentes, que uma vez foram brancos como lençol recém-lavado, hoje são levemente amarelados, como a lâmpada que precisa ser trocada. O sorriso largo e sincero carrega a ovelha negra da família: o incisivo lateral esquerdo, que tem a pequena mancha de flúor desde os tenros anos de dentes permanentes.
Seu queixo, assim como suas orelhas, é tão comum quanto um queixo pode ser, exceto por duas das vinte e três pintas que adornam o rosto, formando pequenas constelações.
O rosto é o palco de teatro no qual ela mostra para o público o que deseja que eles vejam. O cabelo castanho-chocolate se desenrola em cachos que caem sobre os ombros e que formam as cortinas sempre abertas da constante peça que ela é e cujo ato principal está escondido na covinha que só aparece em um sorriso especial.