improvável
Procurou uma cadeira mais ao fundo, um lugar onde as pessoas a vissem, mas que não a deixasse no spotlight. Mais pessoas chegaram e também escolheram seus lugares. Alguns conhecidos, alguns cumprindo os conhecidos estereótipos de uma dinâmica de grupo: as patricinhas, com roupas da moda e cabelos descoloridos; os garotos descolados, com as mangas da camisa dobradas e aquele sorriso torto supostamente cativante; os nerds, com seus óculos e roupas engomadas. No meio daquela festa estranha com gente esquisita galera, reparou na menina de cabelos longos, escuros e lisos. Um sorriso simpático, All Star nos pés, ar despojado. Ela parecia legal. Poderiam ser boas amigas.
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Elas se viam apenas nos dias de jogos da escola. Mas não se gostavam. Por quê? Nem elas sabiam. Então ela começaram a estudar na mesma sala. E perceberam que eram muito parecidas. Tão parecidas que seriam amigas. Para sempre.
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Era a terceira vez que ouvia o mesmo comentário. Nossa, você se parece tanto com aquela menina do terceiro ano. Não, não parecia. Qual era o problema das pessoas? Cabelos cacheados e óculos as faziam gêmeas? Estava ruminando suas silenciosas reclamações na biblioteca quando ela chegou. Tá vendo? Não somos parecidas. Nada parecidas. Um conhecido decidiu mostrar um vídeo dos Muppets, aquele com as fantoches rosas, sabe? Olha, são vocês duas! Deu um sorriso educado e trocou algumas palavras com a sua sósia. Curioso pensar que tudo isso começou em uma biblioteca, elas cercadas de livros, como um presságio. Forever.
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Estava na empresa há algum tempo. Já tinha demarcado seu território se familiarizado e feito alguns amigos. Então ela chegou: a moça nova que ia cuidar do plano de saúde. Ela nunca sabia como agir nesses casos. Sempre que tentava fazer uma pessoa se sentir parte do grupo, ela mesma acaba por se sentir uma estranha no ninho. Mas ela parecia legal. Gostava de ler, ouvia boas músicas, tinha boa cabeça. Se encontravam às vezes quando iam escovar os dentes, trocavam 6 palavras e tchau. Talvez pudessem ser amigas.
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Moravam na mesma rua, tinham nomes similiares, assim como seus pais. Faziam aniversário um dia antes da outra. Gostavam das mesmas coisas. Poderiam ser irmãs, mas eram amigas.
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Era dia de homenagear o coleguinha. Funcionava assim: às sextas-feiras, você podia levar um mimo e presentear um colega que fosse importante pra você. Quando ela parou lá na frente, com aquele mini chapéu laranja de biscuit, eu sabia. Eu sabia que ela me escolheria, da mesma maneira que ela escolheu sentar ao meu lado no primeiro dia de aula. Quando cresceram e ela se mudou de cidade, passaram a trocar cartas e enviar fotos. Esperava ansiosamente pelo carteiro. Não pelo e-mail do Facebook. Pelo carteiro.
E quando enfiou a cabeça pela porta do primeiro ano no primeiro dia de aula, o comentário de sua colega foi “Olha a sua miniatura ali”. Claro que elas eram parecidas, de uniforme escolar todos são iguais. Esqueceu o comentário, até que ele se repetiu inúmeras vezes e a irritou. Mas depois que “Manah-manah” virou sinônimo de amizade, as duas perceberam que eram mais sósias por dentro que por fora.
Ótimo conto, apesar de ser uma história mais particular acho que refete bem esse lado que todos nós temos de querer ficar no fundão, ver sem ser visto, neh ;D