Quando encontrei minha doppelgängster (Parte 3)
Esse texto é a continuação do conto Quando encontrei minha… (Parte 1), e do Quando encontrei minha doppelgängster (Parte 2).
Funciona assim: uma começa, a outra termina e vice-versa. O tema é escolhido por quem começa e é surpresa pra quem termina, só descobrimos junto com vocês, quando for publicado. Clique nos links para relembrar!
Ok, eu só precisava ficar calma, absolutamente calma, e confiar em mim mesma. Eu estava, aparentemente no porta-malas de um carro em movimento, e era provável que o motorista não tivesse licença, por que a cada freada minha cara era esmagada contra uma das laterais.
Percebi que tinha algo na mão direita, um objeto relativamente grande, o que poderia ser? Meu celular! Mas que bandidos mais fajutos, nem acreditei que eles tinham me deixado com o meu companheiro de todas as horas, eu só precisava fazer uma ligação, e resolver essa situação maluca. Meu braço estava torcido em um ângulo impossível, mas os anos de ioga me ajudaram e me contorci naquela jaula sacolejante até conseguir ficar de frente para a tela do celular, mas na escuridão do capuz eu não via nada, nem uma frestinha de luz, tentei traçar na tela o desenho de segurança, mas não, não destravou, tentei apertar o botão de emergência, e nada. Porcaria de tecnologia.
A velocidade do carro foi diminuindo, fui lançada para trás (onde eu imaginava ser atrás), e percebi que subíamos uma ladeira esburacada, cada vez mais devagar, até que paramos. Escondi o celular na meia, acho que eles não iam ignorar o aparelho mais uma vez. Fui arrastada pelos dois trogloditas ladeira acima, já devia estar tarde, eu estava com fome, sede e perdendo a hora da academia. Os dois capangas cumprimentaram um exército de outros capangas, uma porta rangeu abrindo e bateu fechando logo depois que nós entramos, fui colocada numa cadeira com os braços amarrados para trás. Fiquei no silêncio, podem ter se passado horas ou minutos, até ouvir passos lentos e uma voz feminina que soava familiar:
– É ela? Tem certeza Jacaré?
– É sim, é impossível confundir.
– Com essas roupas? Meio estranho…
– É sim, ela estava onde disse no telefone, bem na hora.
– Hmmm, tudo bem, pode tirar o saco pra eu conversar um pouquinho com ela.
Duas mãos desamarraram o capuz que estava apertado em meu pescoço, e quando eu vi o chão imundo de onde estava desejei estar de volta no porta-malas com o capuz.
– Jacaré… Acho que você gosta de testar a minha paciência, só pode ser isso, por que pelo menos pra mim, está óbvio que essa aí não é a Vanessa! – Finalmente uma pessoa sensata que ia resolver meu problema.
– Mas… ela é igualzinha. – E já duvidando de seus olhos. – Não é?
– SAI DAQUI! Sai logo, me deixa ver o que posso fazer!
Um par de botas e barras de jeans gastos saíram do meu campo de visão.
Eu estava de cabeça baixa, nos filmes os bandidos nunca querem ser vistos e eu não queria dar motivo pra uma morte antecipada.
– Querida, você com toda certeza não é a Vanessa, mas vai servir muito bem para o que eu preciso, agora olhe pra mim. – Ela falava com delicadeza enquanto deslizava o dedo pela minha bochecha. Sem muita vontade olhei para ela, que se afastava um pouco para que eu pudesse vê-la melhor. Na minha frente, estava uma mulher de corpo escultural (ainda se diz isso?), usando roupa justíssima, com o cabelo muito loiro e meio bagaceiro, e o rosto dela, EI! Aquele era o meu rosto!
– Mas que palhaçada é essa? – Eu gritei quase que espumando de raiva, mesmo sabendo que não se deve gritar com estranhos, principalmente quando eles têm maior poder de fogo que você. – Mais uma? Quem foi o cirurgião plástico maluco? Aaahhh já saquei tudo, já entendi! O Ivo Holanda vai sair de dentro daquele armário gritando e me mostrando onde tá a câmera escondida, por que isso aqui só pode ser uma pegadinha ~querida.
Minha versão funkeira revirou os olhos e suspirou impaciente, bateu com os dedos na mesa e disse:
– Você parece cansada, e acho que com fome também, eu vou te desamarrar e nós vamos conversar civilizadamente, pode ser? Ah! E só por garantia de disciplina, não se esqueça que eu tenho doze homens armados lá fora. – E sorriu, o pior sorriso falso que eu jamais conseguiria.
Depois de me desamarrar, nos serviu chá com torradas, quanta elegância, como se meu estômago aceitasse qualquer coisa numa situação dessas, e se sentou na minha frente, agora junto à mesa imunda. Aliás, todos os móveis combinavam perfeitamente, todos em estilo lama podre do pântano.
– Olha meu bem… Eu nem perguntei seu nome, desculpe minha indelicadeza, como se chama? – Mas que lady, e eu pensando que estava tratando com marginais.
– Luíza…
– Que lindo nome… Bom Luíza, o meu é Priscila, muito prazer em conhecê-la. E acredite, é realmente um prazer. Eu sei que você deve estar se perguntando como é possível existirem pessoas tão semelhantes como nós, claro, com exceção dos gêmeos idênticos, óbvio que esse não é o nosso caso. Infelizmente não serei eu que vou te dar essa resposta. Eu nem faço questão de saber, tem coisas que é melhor a gente não questionar. Eu encontrei a Vanessa por acaso, ela veio aqui tratar algum assunto com um dos meus sócios e foi só aí que eu tive uma ideia…
– Olha, se você quiser, eu tenho o número da tal Vanessa gravado no meu celular, ela me ligou mais cedo, vocês podem conversar, você conta pra ela a sua ideia e eu finjo que nada disso aconteceu, o que você acha Pri?
– Eu acho… que eu odeio que me chamem de Pri. – Olhos dela ficaram irados por instantes e logo voltaram à expressão calma e cínica. – Como você deve ter percebido, eu não sou a sua versão princesa. Eu tenho alguns problemas com a lei e discordo em alguns pontos com as autoridades locais, e essa minha opinião forte sobre o que é certo e o que é errado acabaram me levando por alguns caminhos diferentes do que a maioria considera decente.
– Meu Deus, quantas palavras desperdiçadas pra dizer que tá fugindo da polícia. – Minha língua comprida ainda me mata.
– Mas você é ainda mais esperta do que eu estava imaginando, gosto disso. Então, continuando a partir de suas próprias palavras, eu estou fugindo da polícia, e minha ideia, seria colocar a Vanessa no meu lugar, e ir aproveitar o meu rico e suado dinheirinho bem longe daqui. Mas como você também pode ver, não temos a Vanessa por perto.
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