o que se pode encontrar numa (c/s)e(s/x)ta

*por Érica Prado

Você poderia me buscar em casa uma sexta feira dessas. Poderíamos ir pra praça ou ir pra outro lugar qualquer, qualquer lugar que tenha vento e grama. Chover nós mesmos, cantar trovoadas, soprar brisas. Não dizer nada. Silêncio acompanhado é tão bom… diálogo mudo é melhor que silêncio sozinho. A gente poderia deixar a preguiça tomar conta e fazer coisas simples, como comer e ficar deitados e ficar falando e ficar cantando e ficar calados e ficar sentados e ficar juntos…
A gente não precisava fazer nada.
Guardar o dia pra não fazer nada é uma coisa que cabe tão bem numa sexta…

E ainda nem é meio dia, mas o sol já vai começar a esquentar. Eu posso me cansar de você, você pode se cansar de mim, a gente pode arranjar alguma coisa pra fazer por um tempo. Eu posso fazer um bolo e você pode fazer um suco. Eu posso trazer alguém que pode trazer um violão que é pra a gente ecoar por aí feito canção.

Um violão é uma coisa que cabe tão bem numa cesta…

Depois a gente podia sair de novo, já ia ser mais de meio dia, a gente podia chamar mais gente, pra encher a felicidade com uma multidão de coisas diferentes.
Eu queria ter alguém com quem eu tenha a liberdade de do nada ligar e chamar pra vir aqui me fazer feliz.
E aí a gente chamava gente que faz poesia, gente que faz música, pintura, fotografia. Gente que não faz nada, gente que dorme de dia. Gente que não tem mar, mas que tem maresia. Gente que tem Dom, mas que não tem Casmurro. Gente que tem Tom, mas que não tem Jobim. Juntar todo tipo de gente com toda forma de amor.
Fazer um sarau improvisado.
Porque sarau é uma coisa que cabe tão bem numa sexta…

Flores. Dores. Odores. Amores. Clamores. Um show.
Tudo cabe tão bem numa cesta.

Sujeira. Música. Bebida. Comida. Risadas.
Tudo cabe tão bem numa sexta.

Maçarocas de cabelo cabem numa cesta. Trotes. Banho quente. Sanduíches. Talheres. Casacos. Dança. Mais risadas. Lágrimas. Correntes. Anéis. Pulseiras. Neon. Mais música. Mais bebida. Brigas. Gritos. Pazes. Bolinhos. Preservativos. Leões.
Tudo cabe tão bem numa sexta!

 

*Érica Prado é mais inconstante que urânio 238. Tenta até ser realista, mas troca a realidade por sonhos com tanta frequência que confunde e funde tudo num emaranhado de utopias soltas. Acha que estamos aqui nesse mundo só pra “rodopiar em busca do que é belo e vulgar” e por isso pretende cursar história e escrever livros mesmo sabendo que nunca vai ficar rica desse jeito. A gente nunca sabe o que vai ser.

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