Do seu lado

Ela percebeu uma pequena mudança de pressão em sua perna, dois apertões, muito leves, ficou alguns segundos atenta para identificar o padrão.

Dois apertões. Pausa. Dois apertões. Pausa.

As pausas eram parecidas, mas não de igual duração, ele não estava contanto. Ela olhou pro rosto dele, ele estava concentrado, distante, tirava a mão de sua perna quando ocasionalmente precisava mudar a marcha. Voltava, e logo recomeçava.

Dois apertões. Pausa. Dois apertões. Pausa.

Ela ainda não tinha entendido. Olhou pra fora desistindo da charada, a chuva ainda estava intensa, mas já diminuía.
Sentia o rosto úmido das lágrimas que há pouco caíram. Os olhos dele também estavam brilhantes. Não conversavam, as conversas já estavam esgotadas. Os dois já estavam esgotados.
Olhava a cidade vazia e escura, imaginando por que a vida de todo mundo parecia tão mais fácil, tão melhor resolvida que a sua, todos tão empolgados com o amanhã, cheios de certezas. Ela se sentia sozinha, fora do eixo, sonhando com uma vida totalmente oposta a sua, onde pudesse ser ela mesma o tempo todo, sem nunca ter que fingir.
A tristeza tomava conta dela de uma forma que parecia irremediável, como se o sol nunca fosse voltar a brilhar. E a escuridão chegava a ser confortável, ela queria afundar mais e mais, submergir naquele mar de desilusões.

Então ela saiu do transe proporcionado por seus sentimentos e observou durante mais alguns instantes para confirmar suas suspeitas.

Dois apertões. Pausa. Dois apertões. Pausa.

Os apertões estavam sincronizados com os postes na rua, vinham no exato instante que eles deixavam um poste para trás. Descobrindo isso ela relaxou no banco.
Enquanto ela tiver alguém assim do seu lado ainda existe esperança.